JAPONISMO

VERBETE DE RENAN KENJI HAYASHI

Docente na Escola Superior de Administração, Marketing e Comunicação – ESAMC/Campinas. Doutorando em Linguística Aplicada pela UNICAMP. Bolsista CAPES (Cód. de Financiamento 001). Mestre em Linguística Aplicada pela UnB. Graduado em Língua e Literatura Japonesas pela UnB.

RESUMO

O presente texto apresenta uma breve definição do termo japonismo, dentro dos estudos da História da Arte, a partir do século XIX. Localizamos o termo na obra do pintor holandês Vincent Van Gogh (1853-1890), em relacionamento com obras do Japão da Era Meiji (1868-1912). Apresentamos um recorte da obra de Van Gogh em contraponto com a obra do pintor japonês Hiroshige (1797-1858).

Revista Arte ConTexto

REFLEXÃO EM ARTE
ISSN 2318-5538
V.6, Nº15, MAR., ANO 2019
VERBETES DA ARTE

Para Schlombs (2009), o início do Japonismo, como movimento artístico europeu, ocorreu na segunda metade do século XIX, mais detidamente a partir da publicação de uma série de artigos com estampas de xilogravuras japonesas na revista francesa La Renaissance littéraire et artistique no ano de 1872. O autor dos artigos foi Philippe Burty (1830-1890), um entusiasta e colecionador da arte japonesa. Os artigos, sob o título de Japonisme1, deram origem na França a uma corrente de estudo que se voltava para o “estudo da arte e do gênio do Japão”. Com efeito, nas três décadas compreendidas entre 1873 e 1903, aconteceram as mais importantes exibições de arte japonesa na capital francesa. Os blocos xilográficos, mas, sobretudo, as estampas de paisagens do Japão pré-moderno da Era Meiji (1868-1912) deram importantes contribuições à pintura europeia às vésperas de empreender o Impressionismo. Cumpre-nos salientar o aspecto histórico de abertura do Japão às nações ocidentais, uma vez que, por meio de iniciativas de exposições de arte em Londres (1862) e Paris (1867), a Europa passou a conhecer mais sobre o conjunto de ilhas que havia permanecido um longo e extenuante período de portas fechadas ao mundo além-arquipélago.

O entusiasmo produzido pelas estampas e pelas cores japonesas foi motivado também pela necessidade dos europeus de novas técnicas e novos conteúdos pictóricos, com os quais os artistas buscassem dar expressão às dramáticas mudanças que ocorriam no século XIX (SCHLOMBS, 2009, p. 85). Com efeito, o que se produziu foi o movimento do Japonismo, que, segundo Van Tilborgh (2010, p. 8), é uma imitação e admiração por virtualmente tudo que tenha procedência do Japão: arte, artigos, roupas, arquitetura. Esse movimento se perpetua até meados do século XX. Essa admiração pode ser vista nas obras de alguns dos grandes nomes da arte europeia, como Claude Monet (1840-1926), Édouard Manet (1832-1883) e, mais notadamente, em Vincent Van Gogh (1853-1890). A literatura da História da Arte é farta em apontar a relação de Van Gogh com o Japonismo. Conforme Ruger (2013) assevera, foi com a mudança do pintor holandês para Paris, em 1886, que o tom das pinturas de Van Gogh se alterou de maneira significativa. De tons escuros e paisagens sombrias, passou-se a querer pintar muitas das cenas vistas nas xilogravuras dos principais pintores japoneses, em especial o mais proeminente do período, o japonês Utagawa Hiroshige (1797-1858). Tamanho era o fascínio do pintor holandês pelas produções do japonês, que muitas obras de Van Gogh assumem contornos de cópia do original de Hiroshige (conferir as figuras 1 e 2).

A impressão de cópia dos originais japoneses foi causada, em muito, pela influência dos pintores nos quais Van Gogh se inspirava para dominar a técnica de pintura francesa, como Degas e Monet, que por sua vez admiravam a arte japonesa. Algumas das obras de Van Gogh têm uma composição quase literal se comparadas ao original, inclusive uma tentativa errante de imitar os ideogramas japoneses nos cantos do quadro, sem muita distinção de traço ou significado. Contudo, segundo Van Tilborgh (2010), foi graças à genialidade do artista que a prática de mimesis deixou de ser a tônica, quando Van Gogh decidiu continuar o estudo das técnicas japonesas olhando com um “olho japonês” para as paisagens. Dessa forma, lançando mão de cortes abruptos dos motivos de fundo, deixando o horizonte para fora da pintura e engrandecendo os detalhes das naturezas pintadas, obtiveram-se resultados espetaculares como em Amendoeira em Flor, de 1890 (conferir figura 3).

Por todo esse percurso, muito brevemente exposto aqui, acreditamos que o movimento artístico do Japonismo deva receber mais esforços acadêmicos de conceituação e divulgação, conferindo relevo não somente ao que a expressão significou na Europa do século XIX, mas seus efeitos nas pinturas dos grandes mestres da arte, como o próprio Van Gogh e muitos outros para além dos mares orientais.

Notas de Rodapé

1 Vale ressaltar que, na literatura da História da Arte, ocorre uma divergência de tradução do termo originalmente cunhado em francês. Se em inglês e francês, a corrente artística é conhecida por Japonisme, em português ocorre ao menos duas entradas: no português europeu a corrente é descrita como japonesismo; já no português brasileiro, o conceito foi cunhado em torno do termo japonismo. Por se tratar de um texto com publicação no Brasil, adotamos este último para discussão e escrita do verbete.

Referências Bibliográficas

RUGER, Axel. Vincent Van Gogh and Japan. In: Japonisme and the Rise of the Modern Art Movement: The Arts of the Meiji Period. Nova Iorque: Thames & Hudson: 2013, p. 215-219.

SCHLOMBS, Adele. Hiroshige. Lisboa: Taschen, 2009.

VAN TILBORGH, Louis. Van Gogh and Japan. Amsterdam: Van Gogh Museum, 2010.

Lista de Imagens

1 Vincent Van Gogh, Bridge in the Rain (after Hiroshige), Paris, 1887, óleo sobre tela, 73,3 x 53,8 cm. Fonte: Van Gogh Museum, Amsterdam (Vincent van Gogh Foundation – https://www.vangoghmuseum.nl/en/collection/s0114V1962).

2 Utagawa Hiroshige, Sudden Shower over Shin-Ôhashi Bridge and Atake, Edo, 1857, nishiki-e (impressão em bloco de madeira), tinta sobre papel, 35,9 x 24 cm. Crédito: Uoya Eikichi. Fonte: Museu of Fine Arts Boston – https://bit.ly/2tapYFU.

3 Vincent Van Gogh, Almond Blossom, Paris, 1890, óleo sobre tela, 73,5 × 92 cm. Crédito: Van Gogh Museum, Amsterdam (Vincent van Gogh Foundation – https://www.vangoghmuseum.nl/en/collection/s0176V1962).