Promover reflexão crítica, estimular a produção teórica, divulgar práticas artísticas: esses têm sido alguns dos principais intuitos da plataforma multimídia Arte ConTexto. Após um ano de atuação, temos buscado ampliar cada vez mais nossa interferência no meio cultural e atingir a sociedade a partir da sensibilização, do diálogo e do questionamento proporcionado pela arte. Assim, a Arte ConTexto, para comemorar o seu primeiro aniversário, desenvolveu o projeto #Reabito, tendo como mote curatorial o eixo temático de sua quarta edição – Repensando a cidade contemporânea: artistas que questionam, modificam, assinalam o nosso modo de habitar.
O projeto #Reabito foi estabelecido como uma proposta múltipla, abarcando ações no contexto urbano, uma noite de festa, exposição e a realização de um curta-metragem que registrou as atividades. Foram convidados dez artistas que desenvolveram propostas relacionadas com a cidade contemporânea: Alexandre De Nadal, Bruno Gularte Barreto, Douglas Jung, Eduardo Montelli, Klaus Volkmann, Marcius Andrade, Priscila Costa Oliveira, Raisa Torterola, Rogério Nunes Marques e Wesley Stutz. Cada um, a partir de poéticas distintas, problematizou detalhes de nossa maneira de habitar, migrando de instalações fotográficas até objetos interativos, luminosos, arte digital, performances e intervenções. Assim, questionaram diferentes pontos de vista sobre uma temática em comum, intensificaram formas de convívio, alteraram espaços e, talvez, aproximaram um pouco mais a experiência artística dos transeuntes da cidade. Durante o mês de outubro, uma série de ações foi realizada em bairros distintos de Porto Alegre, visando à convergência entre as manifestações culturais e a sociedade, abraçando públicos variados. As proposições artísticas culminaram em uma exposição itinerante de seus registros, percorrendo dois espaços: inicialmente, no Galpon (bairro Santa Cecília) com período de visitação de 29/10 a 07/11, e depois no segundo andar da casa Tereg (bairro Centro Histórico), de 12/11 a 06/12. Dessa maneira, a proposta expositiva reiterou a ideia, contida nas ações do #Reabito, de trabalhar nas proporções de uma cidade, de ter como suporte a malha urbana. Todas as atividades desenvolvidas, e aqui incluindo a mostra, criaram uma rede que promoveu a relação entre obra e sítio-urbano.
A ação inaugural do projeto se deu com o trabalho de Wesley Stutz. O artista, que explora a modulação de espaços arquitetônicos e joga com as relações entre espaço interno e externo, incorporou em sua proposição os papéis utilizados em um trabalho anterior na galeria do DMAE 1(2013). Do bidimensional, da superfície dos papéis que preenchia a área das paredes da galeria, para o tridimensional e compacto formato de caixas; de uma galeria para 12 instituições artísticas de Porto Alegre: Acervo Independente, Studio Clio, Fundação Ecarta, Atelier Subterrânea, Vila Flores, Fundação Iberê Camargo, Instituto de Artes, Santander Cultural, Museu de Arte do Rio Grande do Sul, Casa de Cultura Mario Quintana, Museu do Trabalho e Usina do Gasômetro. Cada lugar recebeu esses objetos-presentes que traziam a assinatura #Reabito e, assim, inseriram o projeto no circuito artístico de Porto Alegre, a partir de uma entrega efetiva e literal das caixas.
Já o fotógrafo Marcius Andrade, em seu trabalho A fuga, desestabilizou o universo do caos e do ritmo impaciente da cidade, propondo situações de contraponto, como uma violinista tocando melodias suaves em pleno tráfego da Rua Mostardeiro com a Av. Goethe, ou uma observação distanciada da cidade através do ponto de vista do Lago Guaíba, num passeio sobre uma boia, guiado pela cadencia distinta das ondulações. A partir dos cliques resultantes, o artista construiu instalações fotográficas nos muros da cidade para o escape ao frenesi urbano, estabelecendo situações de silêncio, de fuga à desordem. A artista pelotense, Priscila Costa Oliveira, deu seguimento ao seu trabalho Sentar à Porta, no qual tem convidado moradores de sua cidade para reocuparem o espaço em frente a suas casas como locais de convívio. Dessa maneira, no #Reabito, estimulou a aproximação entre membros de uma das principais ruas do bairro Restinga, potencializando elos sociais.
Outro trabalho realizado, em meio ao espaço urbano, foi o Comfortablescape de Rogério Nunes Marques, artista de Rio Grande. Rogério elaborou um dispositivo, que se adapta em grades e muradas com pontas de metal, permitindo questionar a proibição de acesso a espaços públicos, que acabam tornando-se ambientes hostis aos transeuntes. Com forte caráter político em relação aos limites impostos aos lugares de convívio social, a utilização desses dispositivos ainda permite a suspensão do participante diante do corre-corre das ruas. Estabelece-se um observatório para contemplação do cotidiano das cidades, proporcionando novas paisagens da urbe.
Assim, quem percorria Porto Alegre, no mês de outubro, pôde se deparar com diversas ações artísticas como a do Rogério Marques, as entregas de Wesley Stutz, as fotografias gigantes de Marcius Andrade, ou, ainda, as performances idealizadas pelo coreógrafo Douglas Jung e musicadas pelo concertista e flautista da OSPA, Klaus Volkmann, ocorridas nos bairros Restinga, Centro Histórico e Farroupilha. Para a realização desse trabalho, foi realizada a parceria com o Coletivo Moebius e com o Grupo Experimental de Dança (GED), trazendo a participação dos performers: Alyne Rehm (Moebius); Bianca Brochier (Moebius); Clarissa Brittes (Moebius); Débora Nunes (Moebius); Ferhi Mahmood (Moebius); Priya Mariana Konrad (Moebius); Raquel Vidal (Moebius); Renata Stein (Moebius); Bodh Sahaj (Moebius); Guilherme Guinalli (Moebius e GED); Paula Finn (GED); Priscila Florido (GED) e Maílson Fantinel (GED). O grupo, em um cortejo de espelhos, instigou novos olhares para cidade, a partir dos reflexos lançados aos passantes pelos corpos dos bailarinos em movimento.
A noite de abertura da exposição #Reabito, ocorrida no dia 28 de outubro, contou com outros trabalhos performáticos e ações interativas. A artista Raisa Torterola, junto de Áquila Mattos e Carina Sputnik, apresentou seu projeto Eu-Ilha (organizado pela própria Raisa, Joice Rossato e Marcius Andrade). Três ilhas de resistência se formaram. Os performers estavam vendados e permaneceram, por horas, estanques nos degraus das escadas, ressaltando o isolamento vivenciado entre as multidões. O artista multimídia Bruno Gularte Barreto dispôs no espaço expositivo um conjunto de máscaras sem aberturas para os olhos, mas que propunham um olhar interno, um mergulho no abismo pessoal. Enquanto a superfície exposta ao outro revelava detalhes de arquiteturas da cidade e do corpo humano, o ambiente fechado guardava mensagens sugestivas para outros níveis perceptivos como “Feche os olhos e imagine um rio” ou “Sinta o cheiro do papel”. Seguindo no passo da interatividade, Eduardo Montelli, inspirado nos dizeres de produtos de beleza, disponibilizou crachás adjetivados com frases como “Maciez, disciplina e controle” e “Toque sedoso”. Os crachás estabeleciam identidades a serem assumidas por quem os usasse. Instaurou-se, também, uma separação entre os que possuíam um rótulo e aqueles que não tinham, sendo possível sublinhar no plano poético as segregações ocasionadas pelos estereótipos de beleza. Montelli ainda apresentou uma série de gifs animados que também lidavam com as questões dos padrões de boa forma e culto à estética corporal.
A fachada do espaço Galpon recebeu a intervenção do artista Alexandre De Nadal: um grande luminoso com a frase “Um lugar para chamar de seu", assinada #Reabito, remetendo às frases contidas em materiais publicitários de empreendimentos imobiliários. De Nadal frequentemente levanta questionamentos sobre o crescimento abusivo da influência desses empreendimentos sobre as estruturas das cidades. E, em meio a tudo isso, Douglas Jung realizou sua performance de resistência (un)Dressing Code. Encerrado em uma sala com parede de vidro, Jung desenhou no espaço utilizando movimentos corporais que interagiam com luzes e roupas do cotidiano urbano, propondo discussões sobre a relação contemporânea entre corpo, espaço e meio social.
Como primeira produção curatorial da Arte ConTexto, o #Reabito deu margem para o estabelecimento de outra forma de atuação da plataforma – promover vivências artísticas e culturais. Ao ocupar diferentes regiões, com propostas instigantes, almejamos materializar um pouco dessa imbricação entre arte e cotidiano, possibilitando reflexões sobre de que forma percebemos, ocupamos, construímos e elaboramos nossa cidade.
Nada disso seria possível sem a participação dos apoiadores do projeto #Reabito. Manifestamos, aqui, nossos agradecimentos sinceros à gráfica POA Sign(representada por Vinícius Aroni), à Koralle Pintura e Desenho(representada pelo Frantz e Michele Monteiro), à Bó Jeito de Morar (com Tais Mallaguez), à Paula Osório, responsável pela expografia e cenografia, ao Estúdio Haluz (Felipe Ramalho), à Sinal Sul Comunicação Visual (Andrey Brilhante), à Pizza do Pão (Henrique Goulart), à cervejaria Barco (Christian Piva) e aos espaços Galpon e Tereg (Mariana Falk Giuliano), pelo recebimento e apresentação da exposição.
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