Breves indicações para leitura de uma escrita desorganizada
É guiada por Noemi Jaffe (2016) que inicio. Sou uma descobridora de começos (pelo menos, é o que ela me fez acreditar). Embora estes sejam desordenados, imprecisos e até selvagens, gosto de entendê-los como um espaço ocupado que, pouco a pouco, encontram seu lugar na linha, na página, na tinta derramada, na tela, nos bits, em suma, na palavra prolongada, superlotada de ideias que vêm, ficam e vão. É, eu corro com frequência atrás delas — as palavras —, mas isso não quer dizer que eu as alcance. A plataforma de sinônimos já não é o bastante para encontrar o termo impecável, o discurso alinhado ou até mesmo um tom satisfatoriamente polido.
Há quem diga que basta um gesto. Basta inclinar levemente o corpo, deslocar os dedos com delicadeza. Virgínia Wolf (2014) diria, nesse contexto, que o que necessito é a liberdade de um teto todo meu. Para escrever uma ficção1 desfruto de uma tremenda disposição que tem a lucidez dos seus restos, de suas coisas vagas. Afinal de contas, minhas palavras envelhecem, ecoam histórias, memórias. Elas enrugam, dobram-se, acumulando poeira nos vãos de suas letras.
Portanto, desde já alerto: nesse acanhado amontoado de códigos, existem riscos. É um perigo poroso, transmissível. É um prenúncio liberto, expansivo. É uma leitura e feitura de mundo repleta de entradas e saídas, de incertezas que escapam, escorregam e até corroem o que se entende por uma lúcida estrutura de pesquisa científica. Por essa razão, suas inscrições, verbetes e ranhuras se estabelecem e se reconhecem na instauração de uma espacialidade habitada no mundo, seja revirando espaços, inventando novas relações, outros contatos que tecem correspondências entre a teoria e a prática, indo muito além da linguagem aqui escrita.
Pelo caminho, se inscrevem muito mais questões do que respostas, onde a compreensão do — agora nosso — mundo elabora um ritmo próprio, definindo a localidade que estou: uma leitura poética que perpassa agudos contrastes entre a vida e um processo artístico, abraçando um campo investigativo que descobre espaços matriciais e suas possíveis linhas de horizonte. A começar, eis um diálogo com a superfície, extensão que experimenta materialidades e inventa novos e outros jeitos de multiplicar seus discursos, na alternância do agir e do escrever: