O coletivo de artistas Casa Vendida não poderia ter outro nome. Sete jovens artistas gaúchos procuram ocupar espaços – principalmente residências sem moradores – e fazem de uma exposição de arte um evento para além de trabalhos nas paredes
Uma casa desocupada. Assim, em 2011, com a venda da casa de um amigo do grupo, inicia o coletivo Casa Vendida. Jovens de Porto Alegre, provindos de formações diversas, viram naquelas paredes livres a possibilidade de compartilhar, mostrar e viabilizar (a seu modo) seus trabalhos artísticos.
Unidos primeiro pela relação de amizade, fator corriqueiro quando se trata da união de criadores (refiro-me não somente a coletivos de artistas, como também qualquer forma de união que gere um produto criativo), estes jovens que, se antes produziam individualmente e procuravam de forma isolada um espaço para mostrar suas criações, viram na formação de um coletivo a possibilidade de troca, diálogo e instigação.
Sua formação não é fixa, entretanto, conta com sete principais impulsionadores: Bernardo (Camarão) Viana (Porto Alegre, 1985), João Rubens (Porto Alegre, 1987), Guilherme Ramos (Porto Alegre, 1988), Patrícia Rahde (Porto Alegre, 1988), Henrique Lopes (Santa Maria, 1989), Tiago Berao (Porto Alegre, 1989) e Marcos Tabbal (Porto Alegre, 1987). Contudo, traz como forte característica o caráter agregador, pois, a cada evento, convidam outros criadores que compartilham a vontade de mostrar seus trabalhos, como músicos, tatuadores e até mesmo cozinheiros.
Tendo como primeiro projeto a ocupação desta casa desocupada, na Zona Sul da capital gaúcha, o grupo criou não somente uma exposição de seus trabalhos como também um evento com música, comida e, inclusive, transformaram a sala da residência em um estúdio de tatuagem. A partir daí, projetos surgem de diferentes espaços e áreas, desde uma exposição em um bar no bairro Cidade Baixa, em Porto Alegre, a campanhas de marcas, como Nike, Trópico e a marca de bonés New Era.
A participação do coletivo nestas campanhas vai desde a utilização de seus trabalhos para ilustrar capas de cadernos promocionais a ações como work in progress e, como aconteceu no Meca Festival de 2013, em Xangri-lá (RS), contaram com a participação do público para pintar uma tela, disponibilizando bisnagas de tinta.
O principal objetivo da Casa Vendida é ocupar uma casa, de preferência desocupada. Em 2012, realizaram o evento “Casa Vendida - Homenagem a Celeste Papaleo Fichtner”. Ao entrarem pela primeira vez na casa onde realizariam o evento, o coletivo se deparou, surpreendentemente, com a casa de uma artista. O que seria a segunda edição do que ocorreu na casa vendida na Zona Sul, se transformou também em um memorial de Celeste, uma homenagem do coletivo à proprietária da casa, já em idade avançada.
Assim como existem artistas ou coletivos que ocupam, por exemplo, o espaço público para democratizar suas produções e estas serem vistas por um maior número de espectadores, a Casa Vendida cria uma independência de espaços, como galerias de arte, para mostrar seus trabalhos, no momento em que utiliza paredes de uma residência para exposições. A respeito dos coletivos de artistas, nos anos 1990 – mas que perfeitamente se aplica aos coletivos dos anos 2000 – Claudia Paim afirma, sobre as especificidades de coletivos, e que muito se encaixa à Casa Vendida, “o questionamento que elas propõem sobre os espaços da arte convencionais e o sistema das artes e a criação de outros espaços de circulação para a arte” (PAIM, 2004, p. 3).
A produção de cada artista da Casa Vendida é distinta, permeando a ilustração, o desenho e a pintura. Transformam-se em um grupo no momento em que mostram para o público seus trabalhos reunidos. Trocam ideias e referências e fazem das reuniões – quase semanais – um momento de troca. O coletivo, em pouco tempo, já conta com projetos significativos, mas, ainda, se mostra em transformação constante, como o logotipo, que está por sofrer modificações. Sinal que as engrenagens estão trabalhando e traços novos estão surgindo. Para Camarão, “a Casa Vendida é um quadro acontecendo. Tem o esqueleto da pintura e a gente já fez algum contorno, mas a gente tem que preencher. Um quadro vai mudando, a arte vai mudando. Cada pincelada numa pintura ou numa ilustração, mesmo que seja errada, vai significar alguma coisa”.